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Angola fora da OPEP: Uma decisão solitária em tempos de incerteza

by REDAÇÃO

Em janeiro de 2024, Angola surpreendeu o mundo ao anunciar a sua saída da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), uma decisão justificada por um discurso de afirmação de soberania económica. No entanto, passados quase 18 meses, os efeitos dessa escolha ainda geram mais dúvidas do que resultados palpáveis — e, até agora, nenhum benefício claro foi percebido pela população.

Como membro atento da sociedade civil angolana, sinto que é hora de promover uma reflexão séria sobre essa medida, que não apenas impacta a política externa do país, mas também compromete o seu futuro económico.

Quando o governo rompeu com a OPEP, sugeriu que essa saída permitiria maior liberdade para aumentar a produção de petróleo e atrair novos investimentos. No entanto, a realidade contradiz esse otimismo: a produção manteve-se estagnada, girando em torno de 1,1 milhões de barris por dia — um número muito abaixo do nosso potencial histórico.

Nenhum grande investimento estrutural emergiu no setor, e o país ficou sem os mecanismos de apoio e estabilidade que a OPEP proporcionava, como a defesa conjunta dos preços em tempos de crise. Pior ainda, Angola perdeu voz em decisões cruciais que moldam o mercado global de energia.

Numa altura em que o mundo vive transformações geopolíticas profundas e avança para uma transição energética, é difícil entender por que razão Angola escolheu isolar-se de um fórum onde poderia negociar de forma coletiva os seus interesses. A OPEP, com todas as suas imperfeições, sempre foi uma plataforma de equilíbrio, onde cada membro podia influenciar políticas que afetam diretamente suas receitas.

Ficar de fora significa não apenas abrir mão de proteção econômica, mas também de relevância diplomática. Hoje, Angola tem menos influência no cenário energético internacional — uma perda estratégica num momento em que o país mais precisa atrair investimentos e credibilidade externa.

A questão que muitos se colocam é: a quem realmente serviu essa saída?

A explicação do governo foi vaga. Não houve debate nacional, nem consulta pública, tampouco um estudo de impacto apresentado à sociedade. Tudo indica que a decisão teve mais motivações políticas do que económicas — e, se assim for, torna-se ainda mais preocupante. Estaria o país a ceder a interesses externos em troca de apoios para projetos como o Corredor do Lobito? Ou trata-se de um reposicionamento geopolítico sem benefícios reais para o povo?

Seja qual for o motivo, o resultado é claro: o povo angolano não colheu frutos dessa mudança. Continuamos a enfrentar inflação, desemprego, serviços públicos precários e um sistema de saúde e educação fragilizado.

É neste contexto que urge repensar essa decisão. Sair da OPEP não fortaleceu a soberania nacional — antes, reduziu nossa capacidade de negociação internacional. A ideia de independência energética não pode ser confundida com isolamento estratégico.

É preciso reconhecer que o petróleo continua sendo o principal pilar da economia angolana. E num setor globalizado, decisões unilaterais e sem coordenação com os principais produtores podem custar caro. Reintegrar a OPEP seria, portanto, um passo pragmático e responsável para restaurar a confiança dos mercados e criar condições mais estáveis para o futuro.

A política externa e energética de um país deve estar alinhada com os interesses do seu povo. Decisões dessa magnitude exigem responsabilidade, transparência e um verdadeiro debate nacional. Infelizmente, nada disso foi observado no processo que levou Angola a abandonar a OPEP.

É hora de o Executivo demonstrar humildade e sentido de Estado. Rever essa escolha e considerar o regresso à organização pode ser um sinal de maturidade política — e um passo necessário para garantir a estabilidade económica de que Angola tanto precisa.

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