Em sua intervenção na terceira reunião dos Estados partes do Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares, realizada em Nova York no dia 4 de março, o arcebispo Dom Gabriele Caccia, observador permanente da Santa Sé junto às Nações Unidas, fez um importante apelo à comunidade internacional: é necessário repensar as prioridades globais e direcionar os investimentos para um paradigma de paz, e não para a escalada militar. O discurso foi uma resposta ao retorno da retórica baseada na dissuasão nuclear, que tem reacendido o “perigoso espectro das ameaças nucleares”.
Dom Caccia expressou a preocupação da Santa Sé com o aumento da retórica de dissuasão, que coloca o mundo novamente à beira de uma corrida armamentista nuclear. O arcebispo destacou que esse tipo de abordagem coloca em risco as futuras gerações, enfatizando que a verdadeira segurança e paz não podem ser fundamentadas no medo da destruição mútua, mas na fraternidade entre as nações. O delegado vaticano pediu uma “mudança de prioridades”, onde os recursos seriam melhor direcionados para enfrentar desafios globais como a pobreza, a fome e as desigualdades, em vez de serem redirecionados para o acúmulo de armamentos.
Em seu discurso, Dom Caccia também fez referência ao 80º aniversário dos bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki, que ocorreram em 1945. Ele lembrou o sofrimento indescritível causado por essas armas de destruição em massa, que continuam a deixar efeitos profundos e duradouros nas comunidades afetadas. O arcebispo ressaltou que os danos das armas nucleares não são limitados à perda imediata de vidas, mas também têm consequências psicológicas, culturais e ambientais de longo prazo. Esse legado sombrio, segundo ele, deve ser uma lição para o futuro, para que as atrocidades do passado não se repitam.
Em vez de aumentar os gastos militares, que têm sido uma tendência crescente, Dom Caccia apelou para que os Estados redirecionem seus investimentos para a paz, a segurança e o desenvolvimento humano integral. Para a Santa Sé, é fundamental que a comunidade internacional afirme de forma clara e enfática que “as guerras não são justas, mas somente a paz é justa”. Essa paz deve ser duradoura e estável, construída sobre a fraternidade entre os povos, e não sobre o frágil equilíbrio da dissuasão nuclear.
Apesar das tendências preocupantes em relação ao aumento dos conflitos e ao crescente clima de desconfiança no cenário internacional, Dom Caccia lembrou que o Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares (TPNW) representa um “farol de esperança e progresso” para o desarmamento global. Ratificado por 73 países, incluindo a Santa Sé, o tratado visa eliminar de forma irreversível as armas nucleares, criando um marco jurídico vinculante para a paz mundial. Para o arcebispo, o tratado preenche uma lacuna crítica na arquitetura global de desarmamento e deve ser promovido com sinergia entre os Estados para garantir um ambiente global mais seguro.
Reprodutor de áudioAo final de seu discurso, Dom Caccia citou as palavras do Papa Francisco, proferidas no 53º Dia Mundial da Paz, em 2020, que evocaram o testemunho dos Hibakusha – os sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki. O Pontífice alertou que a memória do sofrimento causado pela guerra nuclear deve ser preservada e reforçada. Como afirmou o Papa, “não podemos permitir que as gerações atuais e futuras percam a memória do que aconteceu”, pois essa memória é fundamental para construir um futuro mais justo e fraterno para todos.
Em resumo, o apelo da Santa Sé é claro: o mundo precisa de um novo paradigma, no qual os recursos não sejam canalizados para a construção de armas de destruição em massa, mas para o fortalecimento da paz, da solidariedade e do desenvolvimento humano. O Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares é um passo importante, mas a verdadeira segurança será alcançada quando a comunidade internacional abraçar a fraternidade e a cooperação como pilares para a paz duradoura.