Lisboa – A história de Olinda Soares, uma mulher que hoje está na casa dos 60 anos, é o ponto central de uma investigação jornalística que lança luz sobre um passado sombrio na Casa de Infância Elísio de Moura, em Coimbra. Este primeiro episódio de *As Pupilas* explora décadas de alegações de abuso e maus-tratos em uma instituição dirigida pelas freiras da Congregação do Amor de Deus, com envolvimento de figuras da Igreja Católica.
Fundada em 1836 e profundamente ligada à Universidade de Coimbra, a Casa de Infância Elísio de Moura abrigou meninas de diversas partes de Portugal durante várias gerações. Para muitas delas, este lugar que deveria ser de acolhimento e proteção se tornou um ambiente de sofrimento e trauma. Nas décadas de 60, 70 e 80, quando Olinda e muitas outras meninas passaram pela instituição, a realidade dentro da Casa era muito diferente da imagem projetada ao público.
Olinda, enviada para a Casa de Infância aos 7 anos, em 1966, relembra um cotidiano de violência, onde freiras mascaravam os castigos e abusos na presença de visitantes. A visita do “paizinho”, como era chamado o diretor e patrono da instituição, Elísio de Moura, trazia uma breve pausa nas humilhações. A história dessas meninas, no entanto, começou a ser contada apenas recentemente, em grupos fechados no Facebook, onde mais de 200 ex-internas compartilharam seus relatos.
Sebastião Cruz, padre e professor catedrático da Universidade de Coimbra, é descrito como o alegado abusador neste primeiro episódio. Cruz, que morreu em 1996, fazia parte da administração da Casa de Infância e foi uma figura de grande influência dentro da instituição. Durante anos, as histórias de abuso que ocorreram sob sua direção foram abafadas.
Os depoimentos de antigas internas, incluindo Olinda, revelam um ambiente de medo e silêncio. Enquanto muitas das mulheres que viveram na Casa recusam expor suas experiências publicamente, cinco delas, entre elas Olinda, aceitaram compartilhar suas histórias nesta investigação.
A Igreja Católica e a resposta às vítimas
O documentário também explora a resposta, ou a falta dela, por parte da Igreja Católica em relação aos casos de abuso sexual que ocorreram na instituição. O Grupo VITA, criado pela Conferência Episcopal para gerir as indemnizações às vítimas, é analisado criticamente no contexto da falta de transparência e da dificuldade em garantir justiça para as sobreviventes.
As “Pupilas” é mais do que uma investigação sobre um período sombrio em uma instituição específica. É um retrato de como o poder e a impunidade podem silenciar vozes e perpetuar o sofrimento de vítimas de abuso. Este primeiro episódio oferece um olhar profundo sobre a história de Olinda Soares e tantas outras mulheres que viveram uma realidade que, por muito tempo, ficou escondida.