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O Caso Pitta Gróz: Quando a Justiça se dobra ao poder

by REDAÇÃO

O procurador-geral da República de Angola, general Hélder Pitta Gróz, voltou a ensombrar a credibilidade da Justiça com uma deliberação altamente controversa. No dia 9 de Maio, ele jubilou o coronel Manuel Jorge como se este fosse magistrado do Ministério Público – um cargo que, segundo a lei, o coronel nunca ocupou formalmente.

A decisão foi tomada pela Comissão Permanente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público (CSMMP), presidida pelo próprio Pitta Gróz. O problema é que Manuel Jorge sempre desempenhou funções administrativas e nunca ingressou legalmente na carreira de magistrado. A jubilação, portanto, parece carecer de base legal.

A justificação do PGR apoia-se em dois artigos da Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público. No entanto, nenhuma dessas normas permite a jubilação de alguém que nunca tenha exercido a magistratura nem ingressado por concurso público — o único caminho legal para se tornar magistrado em Angola.

A situação ganha contornos ainda mais delicados quando se observa a proximidade entre Pitta Gróz e o coronel Manuel Jorge. Ambos trabalharam juntos na Polícia Judiciária Militar, e quando o primeiro foi nomeado procurador militar, levou o segundo com ele para a Procuradoria Militar. Desde então, Manuel Jorge tem ocupado cargos administrativos de confiança — mas nunca como magistrado.

Essa relação de confiança pessoal, com raízes profundas, levanta suspeitas de favoritismo, ou pior: “amiguismo institucionalizado”.

Na mesma deliberação, oito procuradores militares de carreira foram jubilados. Todos eles ocuparam cargos formais e seguiram o percurso legal da magistratura. O coronel Manuel Jorge, no entanto, foi jubilado com uma categoria superior à de qualquer um dos colegas — mesmo sem nunca ter sido magistrado. Um privilégio que a lei não permite.

Esse caso evidencia um fenómeno perigoso: o **temor reverencial**. Um ambiente institucional onde subordinados evitam confrontar decisões superiores, mesmo que sejam ilegais ou injustas, por receio de represálias ou perda de benefícios. O problema não é exclusivo do Ministério Público. O Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), liderado por Joel Leonardo, já enfrenta acusações semelhantes.

Esse comportamento grupal suprime a crítica, favorece abusos de poder e compromete a independência dos órgãos superiores da justiça. É hora de reavaliar a estrutura desses conselhos.

Se confirmados os factos, Pitta Gróz poderá ter cometido actos previstos no Código Penal como crimes. Entre eles:

*”Assunção de falsa identidade** (Artigo 274.º): ao atribuir a Manuel Jorge o estatuto de magistrado.

“Abuso de poder** (Artigo 374.º): por usar o cargo para favorecer um aliado sem respaldo legal.

Claro, qualquer acusação deve respeitar a **presunção de inocência**. No entanto, os indícios são suficientemente graves para merecer investigação rigorosa.

O episódio reforça a necessidade urgente de **reformas estruturais** nos Conselhos Superiores da Justiça. É inaceitável que continuem a operar como redutos fechados, dominados por interesses pessoais ou políticos.

Esses órgãos devem incluir representantes da sociedade civil, académicos, e outras classes profissionais. Precisam de **transparência, diversidade e responsabilização** — valores que sustentam uma Justiça funcional e respeitada.

A antecipação da jubilação de Pitta Gróz já não é apenas uma possibilidade: é uma necessidade. Sua permanência compromete a confiança na Justiça e perpetua uma cultura institucional tóxica. O país precisa virar a página e iniciar um novo ciclo com base em integridade e legalidade.

A Justiça angolana enfrenta uma encruzilhada. Ou se reforma agora, ou continuará a ser corroída por interesses pessoais, decisões arbitrárias e silêncio cúmplice. Este caso não pode ser mais um a cair no esquecimento. O momento de agir não é amanhã — “é hoje”.

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