Home POLÍTICA A Comissão Nacional Eleitoral e o labirinto da Democracia Angolana “CNE: Um Beco com saída difícil”

A Comissão Nacional Eleitoral e o labirinto da Democracia Angolana “CNE: Um Beco com saída difícil”

by REDAÇÃO

À medida que o país se aproxima das eleições gerais de 2027, as tensões em torno da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) ganham destaque no cenário político. O centro das atenções é a figura do presidente da comissão, o juiz Manuel Pereira da Silva, conhecido como “Manico”, cuja recondução ao cargo tem sido alvo de contestação, especialmente por parte da UNITA, o maior partido da oposição.

A tentativa da UNITA de barrar a tomada de posse do presidente da CNE por meio de uma providência cautelar foi rejeitada pelo Tribunal Constitucional. O argumento do tribunal baseou-se na alegada ilegitimidade da Assembleia Nacional como parte no processo, remetendo a responsabilidade para o Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ). Essa decisão levantou dúvidas jurídicas, especialmente por minimizar o papel do parlamento e limitar os mecanismos de impugnação de atos administrativos.

Apesar da controvérsia, o foco agora se desloca para a reforma das leis eleitorais. Tanto o Executivo como a oposição apresentaram propostas, que foram aprovadas na generalidade e seguem em debate na especialidade. Notavelmente, a UNITA optou por abster-se em relação à proposta presidencial, gesto interpretado como abertura para o diálogo.

Um ponto crítico de divergência continua sendo o funcionamento da própria CNE. A oposição tem defendido uma reformulação da instituição para garantir maior transparência e confiança no processo eleitoral. A proposta da UNITA prevê manter os 17 membros da CNE, mas com uma nova composição: dois representantes por grupo parlamentar, um jurista de mérito selecionado por concurso e os demais indicados pela sociedade civil. O presidente e o vice seriam escolhidos entre os comissários civis, após votação secreta.

No entanto, mesmo esse modelo levanta preocupações. Dada a atual composição do parlamento, com maioria absoluta do MPLA, há o risco de que a maioria continue a influenciar decisivamente a formação da CNE, mantendo o desequilíbrio que a oposição deseja corrigir. A proposta, nesse sentido, pode acabar sendo um “tiro no pé”, pois não resolve o problema de fundo: a percepção de parcialidade da comissão.

Alternativas têm sido debatidas, como a criação de um tribunal eleitoral independente, nos moldes do modelo brasileiro, ou a completa digitalização do processo eleitoral. No entanto, ambas as soluções enfrentam resistência. Há quem tema que a politização do Judiciário comprometa a imparcialidade de um tribunal eleitoral, e outros desconfiam da segurança tecnológica da votação eletrônica.

O impasse parece, portanto, estrutural. A própria lógica do sistema eleitoral angolano — onde uma única eleição decide tudo, do presidente ao governo local — contribui para a pressão e os conflitos intensos. Esse modelo de “tudo ou nada” gera radicalismo, desconfiança e constantes disputas sobre a legitimidade dos resultados.

Uma proposta viável para aliviar essa tensão seria adotar um sistema eleitoral segmentado. Separar as eleições legislativas, presidenciais e locais permitiria uma maior distribuição de poder e representatividade. Além disso, essa divisão favoreceria uma expressão mais refinada da vontade popular, onde o eleitor poderia optar por diferentes partidos ou candidatos, conforme o cargo e a proposta.

Em suma, o debate sobre a CNE é apenas a ponta do iceberg. O verdadeiro desafio está em reconfigurar o modelo político-eleitoral de forma a garantir equilíbrio, pluralismo e estabilidade. Sem isso, qualquer tentativa de reforma institucional corre o risco de ser inócua — apenas mudando as peças, mas mantendo o mesmo jogo.

related posts

Leave a Comment