No xadrez político angolano, certos nomes surgem com força nos bastidores do poder. Entre eles, Fernando Garcia Miala se destaca como uma figura enigmática e influente, cuja trajetória percorre décadas de envolvimento com os serviços secretos e as estruturas de defesa do Estado. Embora ainda nos bastidores, rumores indicam que o atual Presidente João Lourenço pode estar a apoiar Miala como potencial sucessor à liderança do país.
Nascido em Luanda, de raízes familiares nas províncias do Uíge e Kwanza-Sul, Miala iniciou o seu percurso nos anos turbulentos da Angola pós-independência. Com ligações iniciais à Brigada da Juventude Revolucionária (BJR), associada à FNLA, viu-se mais tarde integrado nas FAPLA, no setor de Contrainteligência Militar.
O seu talento levou-o a missões em São Tomé e posteriormente a Saurimo, onde colaborou com a Escola de Instrução da Segurança do Estado. A virada decisiva aconteceu quando foi descoberto por José Manuel Domingos — hoje conhecido como brigadeiro “Tunecas” — e convidado a integrar a estrutura de segurança da Presidência da República, no icónico “Futungo de Belas”.
Dos Bastidores ao Centro do Poder
Na década de 1980, durante o auge da Guerra Fria, Miala foi envolvido numa investigação sensível relacionada ao desaparecimento da filha de um embaixador checo. A sua atuação nesse episódio marcou o início de uma carreira sólida nos corredores do poder, ganhando a confiança de figuras como o então secretário presidencial para a Defesa e Segurança, general José Maria.
Apesar de uma posterior cisão com este último, que levou ao seu afastamento temporário, Miala foi recuperado por Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa” — outro nome forte do sistema de segurança do regime. A partir daí, consolidou-se como um dos pilares da inteligência nacional, liderando estruturas como o COSSE e, mais tarde, o Serviço de Segurança Externa (SSE).
Figura Central na Guerra Contra a UNITA
Durante os anos finais da guerra civil, Miala desempenhou um papel crucial na neutralização das redes externas da UNITA. Com operações de aliciamento e desmantelamento de comunicações, tentou minar a capacidade da guerrilha no estrangeiro, tendo inclusive conseguido convencer um dos filhos de Savimbi, Araújo Sakaita, a regressar a Angola.
Após a morte de Jonas Savimbi, foi Miala quem liderou esforços para trazer de volta desertores e antigos membros da UNITA exilados em países como Zâmbia, Togo e Burkina Faso. A sua atuação diplomática ajudou a suavizar o clima político e a preparar o terreno para o período de paz.
Do Auge à Queda – E ao Regresso
Apesar de ter sido reconduzido como diretor do recém-criado Serviço de Inteligência Externa (SIE) em 2002, e nomeado Secretário do Conselho Superior de Segurança Nacional — posição que o colocava como coordenador máximo dos serviços secretos angolanos — a sua carreira sofreu um duro revés em 2006. Envolvido em disputas internas com outros generais influentes, como José Maria e “Kopelipa”, foi afastado, julgado e preso.
Após cumprir pena, Miala recusou-se a pedir perdão público ao então Presidente José Eduardo dos Santos, afirmando que não havia cometido traição alguma. Libertado por um indulto presidencial, reapareceu em público num culto da Igreja Simão Toco, onde discursou de forma conciliadora, declarando não guardar ressentimentos.
Reconhecimento Continental e Reaparecimento Político
Mesmo afastado por um tempo, o prestígio de Miala ultrapassa fronteiras. É reconhecido por líderes africanos como Joseph Kabila e Paul Kagame, mantendo ainda uma relação próxima com o Presidente moçambicano Filipe Nyusi.
Recentemente, surgiram indícios de que seu nome voltou ao centro das atenções políticas, com rumores sobre uma possível nomeação ao Ministério da Defesa Nacional e dos Veteranos da Pátria. A sua imagem tem sido promovida discretamente em plataformas digitais, sugerindo uma preparação silenciosa para um eventual regresso ao alto comando do Estado.
Fernando Garcia Miala permanece como uma das figuras mais complexas e discretas do universo político angolano. A sua trajetória reflete a fusão entre inteligência, lealdade institucional e ambição — ingredientes que podem, eventualmente, colocá-lo mais uma vez no centro da tomada de decisões em Angola. Resta saber se esta será, de facto, a sua nova missão política.