Ativistas angolanos recentemente libertados de prisão criticaram o indulto concedido pelo Presidente João Lourenço, descrevendo-o como um “presente envenenado” que os obriga a reconhecer crimes que não cometeram. Em uma conferência de imprensa realizada em Lisboa, membros do movimento cívico Friends of Angola (FoA) e do Observatório para Coesão Social e Justiça (OCSJ) se uniram para denunciar a injustiça de sua detenção e condenação, que ocorreu em setembro de 2023.
Os ativistas Adolfo Campos, Abraão dos Santos (conhecido como “Pensador”), Gilson da Silva Moreira (“Tanaice Neutro”) e Hermenegildo André (“Gildo das Ruas”) estiveram presos por mais de um ano antes de serem libertados em 6 de janeiro, no âmbito de um indulto presidencial que contemplou 51 cidadãos. O perdão foi parte das comemorações dos 50 anos da independência de Angola, mas, para os ativistas, sua liberação veio com um custo: o reconhecimento de crimes que eles afirmam não terem cometido.
De acordo com eles, o indulto serviu para passar a imagem de João Lourenço como um “bom samaritano”, mas de forma astuciosa, obrigando-os a aceitar uma culpa que não corresponde à realidade. Em suas palavras, a libertação foi mais um golpe político do que um gesto genuíno de perdão.
Além disso, os ativistas relataram condições desumanas nas prisões angolanas, incluindo a falta de alimentos, espaços adequados e tratamento digno. Adolfo Campos, por exemplo, descreveu a cadeia onde esteve preso como uma “pocilga” e alertou para o que considera um “genocídio” nas prisões do país, citando o alto número de mortes de prisioneiros, como no caso da ala infecciosa da prisão de São Paulo, onde mais de quatro pessoas morriam diariamente.
Outro ponto central foi a luta contínua pela justiça. Gilson da Silva Moreira, insatisfeito com a situação social e econômica do país, deixou claro que a luta por uma mudança em Angola não terminou com sua libertação. Ele fez um apelo à união dos angolanos para mudar o país, destacando a fome como o maior problema do momento e expressando sua disposição para se tornar um candidato nas eleições de 2027, se necessário.
Abraão dos Santos também reforçou a ideia de uma luta coletiva, afirmando que os ativistas seguirão com ações legais para garantir que seus direitos sejam respeitados e que a justiça seja feita. Para ele, o processo judicial que resultou na prisão deles foi uma “montagem política” para calar vozes críticas.
O advogado Zola Bambi, que representou os ativistas, destacou a ilegalidade da prisão e a manipulação política que ela envolveu, lembrando que a libertação dos ativistas foi uma ação discricionária do presidente e não resultado de um julgamento justo. Bambi também mencionou o caso de José Filomeno dos Santos, filho do ex-presidente José Eduardo dos Santos, que, ao renunciar ao indulto, afirmou que o perdão não anulava os efeitos da condenação, apenas suspendia a pena, o que ele considerou um “equívoco legal”.
Para as organizações cívicas, a prisão dos ativistas foi uma tentativa de intimidar a sociedade civil e silenciar aqueles que defendem uma Angola mais democrática e justa. Elas ressaltaram que, em nenhum momento, os ativistas violaram a Constituição ou os direitos de manifestação e reunião, que são direitos fundamentais protegidos por lei.
Os ativistas garantiram que sua luta por uma justiça mais digna e por um país mais justo está longe de terminar. Eles prometem continuar a mobilizar a sociedade e a buscar justiça, seja por meios legais ou por protestos, até que seus direitos sejam reconhecidos e respeitados.