Luanda – O recente relatório da Perita Independente das Nações Unidas, Attiya Waris, trouxe à tona sérios desafios que Angola enfrenta em termos de desenvolvimento socioeconômico. Entre os principais problemas destacados estão as profundas desigualdades sociais, a extrema pobreza e deficiências críticas em áreas essenciais como educação, saúde e segurança alimentar. Esses problemas são agravados pela corrupção e pelos fluxos financeiros ilícitos, que minam o progresso econômico e social do país.
Apesar de Angola ter alcançado uma estabilidade política após o fim da guerra civil que durou 27 anos, o relatório aponta que o país ainda lida com fragilidades graves. Segundo Waris, a corrupção continua sendo um dos principais obstáculos ao desenvolvimento, afetando diretamente a capacidade do Estado de gerar receitas e implementar políticas públicas eficientes.
A corrupção e a insatisfação popular
A crescente insatisfação da população com o aumento da corrupção, especialmente no setor judiciário, é um dos pontos críticos levantados pelo relatório. O documento sugere que uma mudança de governo pode ser uma medida necessária para enfrentar esses desafios. Essa opinião é compartilhada por alguns analistas locais, como David Boio, que ressaltam a falta de transparência nas decisões governamentais, principalmente em processos de adjudicação.
Boio destaca que a “legalização de ilícitos financeiros” e a ausência de clareza nas contratações diretas minam os esforços para combater a corrupção e prejudicam a confiança pública no governo. Em contrapartida, o analista político Bali Chionga vê os resultados do combate à corrupção de forma mais positiva, afirmando que, embora os desafios sejam enormes, há progresso desde 2017.
Dívida externa e gestão econômica
Outro ponto de preocupação destacado no relatório é a crescente dívida externa de Angola, que já ultrapassa os 21 bilhões de dólares, sendo a maior parte devida à China. Esse fator levanta sérias questões sobre a sustentabilidade da gestão econômica do país.
O economista Conceição Andrade também apontou a má gestão pública como a raiz do problema, sugerindo que é essencial reduzir os gastos excessivos e os privilégios concedidos aos membros do governo. Ele criticou a falta de transparência, destacando que a Presidência da República é um dos órgãos que mais consome recursos do Orçamento Geral do Estado.
O impacto social e a crise no setor da justiça
Além dos desafios econômicos, o relatório da ONU chama atenção para a deterioração das condições sociais em Angola. O aumento do custo de vida tem gerado um crescente descontentamento em vários setores da sociedade. Salvador Freire, da organização de defesa dos direitos humanos “Mãos Livres”, destacou a crise no sistema judiciário, afirmando que a impunidade continua sendo um problema generalizado no país.
Freire criticou a falta de transparência nos processos de recuperação de ativos desviados por corrupção, apontando que as mesmas pessoas envolvidas nesses processos têm se beneficiado, enquanto os resultados não são visíveis na vida dos cidadãos. Segundo ele, não há clareza sobre os valores recuperados e o destino desses recursos.
Recomendações para o futuro
Para enfrentar esses desafios, o relatório da ONU recomenda uma revisão dos subsídios aos combustíveis, como uma possível solução para aliviar a pressão social sobre a população. Essa medida, de acordo com Waris, poderia ajudar a redistribuir recursos de maneira mais equitativa e fortalecer áreas como saúde, educação e segurança alimentar, que são fundamentais para o desenvolvimento sustentável de Angola.
O relatório de Attiya Waris serve como um alerta para a necessidade urgente de reformas estruturais no combate à corrupção e na gestão dos recursos públicos em Angola. Sem essas mudanças, o progresso social e econômico do país continuará sendo comprometido, perpetuando as desigualdades e a pobreza extrema que afetam grande parte da população.