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A tragédia silenciosa de Viriato da Cruz: uma história Esquecida “nome pagado”

by REDAÇÃO

Em meio à constante marcha do tempo, convido você, leitor, a fazer uma pausa reflexiva comigo. Vamos olhar para o passado, especialmente para um dos episódios mais sombrios e negligenciados da história política de Angola: o destino trágico de Viriato da Cruz, um dos principais arquitetos da luta pela independência do país.

A narrativa da história contemporânea de Angola, sobretudo a partir da década de 1950, tem sido marcada por manipulações, omissões e leituras distorcidas. O poder político dominante, tanto quanto muitos setores acadêmicos e intelectuais — em Angola, Portugal e Brasil — têm contribuído para uma construção histórica profundamente enviesada. A verdade, nesse contexto, tornou-se uma vítima constante.

Pouco se estuda, de forma séria, sobre Viriato da Cruz — fundador do MPLA e uma das vozes mais influentes do nacionalismo angolano. Foi ele quem concebeu e deu forma ao Movimento Popular de Libertação de Angola, tanto no plano ideológico quanto estratégico. Mas, ironicamente, foi também alvo de um processo sistemático de apagamento por parte dos próprios companheiros de luta.

Exilado na China, terminou seus dias humilhado, abandonado e submetido à violência psicológica e física. Uma tragédia que permanece cercada por silêncio, versões distorcidas e uma clara tentativa de reescrever os fatos.

Para compreender esse apagamento, é inevitável mencionar Agostinho Neto, figura central na história do MPLA e da independência de Angola. Com o tempo, Neto foi alçado a um patamar quase divino, transformado em ícone incontestável da nação — um “super-homem”, na visão oficial. Essa imagem foi amplamente promovida pelo regime e acolhida por universidades que, em vez de investigar, passaram a cultuar.

Esse culto à personalidade tem bloqueado o avanço de estudos críticos e aprofundados. Viriato, que deveria ocupar lugar de destaque na memória nacional, acabou relegado a uma nota de rodapé.

Neto, durante a sua liderança, cometeu atos brutais. Por rivalidades políticas, ordenou a eliminação de diversos companheiros do próprio MPLA. Alguns, como Daniel Chipenda, escaparam por pouco. Outros, não tiveram a mesma sorte.

Esse comportamento autoritário se intensificou após a independência, quando Neto instaurou um regime de forte repressão interna, que culminou em eventos sangrentos como o 27 de Maio de 1977 — episódio marcado por assassinatos em massa e perseguições a dissidentes.

Viriato da Cruz, símbolo da dissidência e do pensamento livre dentro do MPLA, foi uma das primeiras vítimas dessa mentalidade autoritária. Desde os primeiros anos do movimento, Neto já demonstrava sinais de intolerância, como na conferência de 1962, onde impediu que a lista concorrente de Viriato fosse votada democraticamente. Ali ficou claro: o poder não seria partilhado.

Essa trajetória de exclusão, autoritarismo e culto à personalidade tem consequências profundas até hoje. Ao canonizar um líder como figura sagrada e inquestionável, a sociedade angolana perde a capacidade de olhar criticamente para o seu passado — e, por consequência, compromete o seu futuro.

Viriato da Cruz representa um símbolo de tudo que foi silenciado: a diversidade de pensamento, a disputa democrática e a construção coletiva. Resgatar sua memória é uma forma de reequilibrar a história e abrir espaço para uma reconciliação real, livre de mitos impostos e versões oficiais.

Desmistificar o passado não é desrespeitar a história, mas honrá-la com honestidade. O silêncio em torno de Viriato da Cruz deve ser quebrado para que Angola possa, finalmente, construir uma identidade nacional mais justa, plural e baseada na verdade. Enquanto os mitos forem mais fortes que os fatos, a ferida da memória permanecerá aberta.

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