Luanda voltou a ser palco de uma tragédia que expôs a negligência das autoridades e a fragilidade do sistema de justiça. A jovem Otchali do Amaral, conhecida carinhosamente como Lindiane, de apenas 16 anos, perdeu a vida ao ser atropelada por um agente da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), Apolinário Marques da Silva, enquanto atravessava a perigosa estrada Fidel Castro.
A via, marcada pela falta de passadeiras, iluminação precária e alta velocidade dos veículos, já era conhecida como cenário frequente de acidentes fatais.
Lindiane, estudante do Instituto Médio de Saúde Filipe Mendonça, nutria o sonho de estudar Medicina e planejava seguir para Inglaterra para dar continuidade à sua formação. Seu futuro brilhante foi brutalmente interrompido, e sua morte abalou não apenas a sua família, mas toda a comunidade escolar.
Testemunhas afirmam que o agente da PIR conduzia uma viatura Land Cruiser a uma velocidade excessiva no momento do acidente. O mais alarmante: este não seria o primeiro atropelamento fatal envolvendo o mesmo agente.
Mesmo com o histórico grave, Apolinário Marques da Silva foi libertado poucos dias após o acidente, mediante caução, sem que houvesse qualquer avanço público nas investigações. A revolta cresce à medida que detalhes da atuação dos Serviços de Investigação Criminal (SIC) vêm a público: o corpo da jovem ficou exposto no local do acidente por cerca de quatro horas, sem realização de perícia, recolha de provas ou qualquer exame de alcoolemia no condutor.
Não houve avaliação técnica da viatura nem registo oficial adequado das circunstâncias do acidente — falhas que, segundo especialistas, comprometem qualquer chance de uma investigação séria e imparcial.
A falta de ação e o histórico de impunidade alimentam suspeitas de favorecimento, especialmente considerando as ligações familiares de Apolinário dentro da estrutura da PIR. A família de Lindiane teme que o caso siga o mesmo caminho de tantos outros em Angola: encerrado sem qualquer responsabilização.
“O Estado não protege os nossos filhos enquanto vivos, e ainda lhes nega dignidade após a morte”, desabafou um familiar durante o funeral da jovem.
A estrada Fidel Castro, onde o acidente ocorreu, já é tristemente conhecida pelos inúmeros óbitos. Só este ano, dezenas de vidas foram perdidas ali, incluindo uma bebé e sua babá, além de um professor. Apesar dos apelos da sociedade, o governo permanece inerte, sem implementar medidas básicas como passadeiras elevadas, semáforos ou redutores de velocidade.
Enquanto isso, Apolinário Marques da Silva segue em liberdade, e a sensação de impunidade ecoa entre famílias que choram seus mortos, sem respostas ou justiça.