Graça Campos/Correio Angolense
À data secretário para a Informação e Propaganda do MPLA, na sua mais recente entrevista à LAC, em Janeiro passado, Rui Falcão rejeitou, de modo categórico, uma revisão constitucional que habilite João Lourenço a disputar um terceiro mandato.
Como milhões de angolanos, Rui Falcão ouviu e acreditou no que o Presidente João Lourenço disse no dia 16 de Outubro de 2023, em sede da Mensagem sobre o Estado da Nação.
“No dia 15 de Setembro de 2022, na sequência das eleições gerais que conferiram legitimidade ao Presidente da República e aos Deputados à Assembleia Nacional, jurei por minha honra desempenhar com toda a dedicação as minhas funções, cumprir e fazer cumprir a Constituição e as leis, defender a Independência, a Soberania, a unidade da Nação e a integridade territorial e defender a paz e a democracia e promover a estabilidade (…) Esse juramento continua válido e será por mim honrado até ao último dia do mandato de 5 anos que as angolanas e os angolanos legitimamente me conferiram”.
O mandato de 5 anos que “as angolanas e os angolanos legitimamente conferiram” a João Lourenço expira em Setembro de 2027, com a tomada de posse do Presidente eleito. Mas, ou porque interpretou mal a afirmação do Presidente da República ou porque a sua entrevista à LAC foi mal interpretada, o facto é que Rui Falcão perdeu assento no secretariado do Bureau Político do MPLA escassos dias depois da entrevista.
Expresso em palavras que entraram nos ouvidos de todos os letrados angolanos sem qualquer “ruído”, o compromisso do Presidente de honrar até ao último dia o mandato de 5 anos não se prestou a quaisquer más interpretações. O mesmo se passou com o que Rui Falcão disse à LAC.
Não tendo sido entrevistado na condição de cidadão comum, o que Rui Falcão disse vinculou, ou pelo menos traduziu, o que ouvia no secretariado do Bureau Político.
O que Rui Falcão e muitos angolanos não equacionaram é que o Presidente João Lourenço nunca se desinteressou genuinamente do terceiro mandato.
Em 2001, o antecessor de João Lourenço disse que quer se realizassem em dois ou três anos, o próximo candidato do MPLA à eleição presidencial não se chamaria José Eduardo dos Santos.
Como sabemos, José Eduardo dos Santos deixou o poder apenas 16 anos depois e praticamente puxado pelo colarinho. Sempre que questionado sobre se disputaria um terceiro mandato, João Lourenço ou esquivou a pergunta ou tergiversou. É por isso que, avisados, muitos angolanos não levaram a peito o compromisso de João
Lourenço de cumprir o último mandato.
E tinham razão!
O Presidente João Lourenço reajustou a sua estratégia do futuro. Nela cabem, neste momento, duas alternativas.
A primeira, a que chamaremos de Plano A, consiste em “trabalhar” a esposa para a sua sucessão. A segunda, ou Plano B, consiste na alteração da Constituição, de modo a esticar os mandatos presidenciais.
O Plano A está a cargo de um grupo multidisciplinar, ao serviço do qual já foram contratados serviços especializados, internos e externos.
A presença, quase permanente, da esposa do Presidente da República em actividades que atraem a comunicação social pública não é fortuita.
Quem se entrega ao “deleite” de espreitar, diariamente, a primeira página do Jornal de Angola dará de cara com Ana Dias Lourenço pelo menos uma vez por semana.
Para o Plano B, está recenseado, e já em execução, o aliciamento de figuras religiosas, músicos, e outros actores proeminentes da sociedade.
Não é casuística a súbita preocupação com o bem-estar da diáspora, sobretudo a que reside na Europa.
Mas, o eixo central desse plano é o aliciamento de deputados na oposição.
Mesmo que todos os seus 124 deputados votassem a favor, algo que o próprio João Lourenço toma como muito improvável, o MPLA não seria capaz de introduzir na CRA uma alteração que acomodasse a extensão dos mandatos presidenciais.
E ainda que aos seus deputados juntassem os votos do PRS (2), FNLA (2) e PHA (2), o MPLA ficaria a 14 votos para perfazer os 2/3 que uma revisão constitucional requer.
Com recursos financeiros ilimitados, um conhecido académico, membro da cúpula do MPLA, está encarregue de “mobilizar”, nas hostes da UNITA (que reúne deputados indicados pela UNITA, PRA-JA e Bloco Democrático), os votos indispensáveis.
Congeminada pelos defensores do terceiro mandato, a ruptura de Francisco Viana com a bancada parlamentar da UNITA não deu lugar ao terremoto que se calculava. Pensou-se que Francisco Viana fosse capaz de arrastar consigo uma “multidão” de deputados.
Quando olhou para trás e para os lados e não vislumbrou vivalma, Francisco Viana enfiou a viola no saco e regressou às “origens”.
Mas, a malsucedida tentativa de esvaziamento da bancada parlamentar da UNITA não esmoreceu os arautos do terceiro mandato.
Não se dando por vencida, a turma tomou agora como alvos os 16 “discípulos” de Abel Chivukuvuku na bancada parlamentar da UNITA.
Há duas semanas, Abel Chivukuvuku deu como praticamente garantida a legalização, pelo Tribunal Constitucional, do PRA-JA Servir Angola, que agora baptizou como PRA-JA Força Angola.
Não se sabe se haverá algum nexo entre o assédio aos 16 deputados e as “garantias” que Abel Chivukuvuku diz ter segundo as quais o Tribunal Constitucional já removeu todas as barreiras à legalização do agora PRA-JA Força Angola.
Transformado, por obra e graça do Presidente João Lourenço, em ilhas incomunicáveis, a vitória da turma pró-terceiro mandato pode, paradoxalmente, desunir irreversivelmente o MPLA.
É que dirigentes como Rui Falcão e outros que, em surdina, se opõem a um terceiro mandato, dificilmente engolirão, sem o risco de se engasgarem, sapo tão fartamente nutrido.