MISA lembra que as vítimas do naufrágio ocorrido na Ilha de Moçambique foram enganadas porque tiveram acesso a informação deturpada sobre um surto de cólera.
A desinformação é um problema muito sério que pode levar a tragédias como a que aconteceu no domingo(07.04), quando uma embarcação superlotada com cerca de 130 ocupantes saiu do posto administrativo de Lunga com destino à Ilha de Moçambique, na província de Nampula. O aviso é de Armando Nhantumbo, do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA).
O oficial de comunicação da instituição não-governamental diz, em entrevista à DW, que “as pessoas que entraram naquela embarcação em pânico” e abandonaram as suas residências e aldeias “foram vítimas de desinformação”.
A “desinformação” tinha a ver com um alegado surto de cólera naquela ilha, o que levou os populares a pensarem que as suas vidas estavam em perigo. Eram “boatos” que circularam nas comunidades, precisa Armando Nhantumbo, a informação não foi veiculada por jornalistas.
Este não é um fenómeno novo. De acordo com o jornal “O País”, a desinformação sobre a cólera já matou pelo menos 125 pessoas em Moçambique. No naufrágio do passado domingo morreram 98 pessoas.
Há vários anos que morrem moçambicanos na sequência da onda de boatos sobre acólera em Moçambique.
As vítimas, de a.cordo com Armando Nhantumbo, são na sua maioria líderes locais e técnicos de saúde, acusados de propagar a doença. São mortos por elementos da população que os acusam de serem responsáveis pela transmissão de casos de cólera às comunidades.
Cólera por cloro
O oficial de comunicação do MISA-Moçambique lamenta, no caso do naufrágio, ter havido deturpação e manipulação de informação relativamente à distribuição de cloro nas comunidades da ilha. Armando Nhantumbo diz que se inventou informação de que as autoridades estavam a distribuir cólera em vez de cloro.
“Cólera não se distribui, de forma alguma, num frasco para entregar às pessoas. E o resultado é este que estamos a ver”, afirma, pedindo a todos os moçambicanos para estarem atentos e unidos na luta contra a desinformação.
Para combater o mal, o MISA-Moçambique dá conta que tem feito trabalho de campo, que inclui a formação de jornalistas para o exercício de verificação dos factos e de notícias. “Este tem de ser um trabalho de todos nós”, exorta Nhantumbo, que quer ver envolvidos a sociedade civil, os média e as autoridades, “no sentido de garantir que as pessoas tenham acesso a informação de qualidade”.
Jornalismo responsável
Jeremias Mondlane, secretário do Sindicato Nacional dos Jornalistas para a província de Maputo, também está preocupado com a situação e, por isso, critica “o imediatismo” no tratamento da informação em Moçambique.
No Dia do Jornalista Moçambicano e na data em que se assinalam os 46 anos do Sindicato Nacional dos Jornalistas no país, o lema é “responsabilidade”.
Jeremias Mondlane diz que é preciso dar formar mais os jornalistas para que eles possam informar melhor as populações.”
A preocupação, neste momento, é que a informação seja cada vez mais responsável e traga resultados satisfatórios para o desenvolvimento da sociedade”, refere.
O jornalista considera que, face aos demais desafios, “não é fácil esta guerra da comunicação”, num país que enfrentou vários conflitos armados. Por isso, pede unicidade à volta daquilo que deve ser informação com rigor e equilíbrio.
“Temos muitos ‘paraquedistas’ que entram na comunicação social sem nenhum conhecimento, fazem um jornalismo irresponsável, precipitado, desequilibrado e, em última instância, desabona a profissão”, denuncia. “Isto cria alguma frustração para quem já exerce a profissão há algum tempo”, desabafa.
O caso “Ibraimo Mbaruco”
Jeremias Mondlane admite que a liberdade de imprensa em Moçambique está presente, mas a libertinagem também a acompanha. “Este é o grande problema”, adianta Mondlane, que também comenta o desaparecimento, há quatro anos, do jornalista moçambicano Ibraimo Mbaruco, raptado ao regressar da Rádio Comunitária de Palma, na província nortenha de Cabo Delgado.
“Este é um assunto que está na alçada das entidades competentes. Não teria autoridade para falar desse assunto”, explica. Acredita, entretanto, que as autoridades moçambicanas estão a fazer tudo ao seu alcance “no sentido de esclarecer este caso”.
Jeremias Mondlane considera que, numa altura em que o país enfrenta estas atrocidades, incluindo os atos bárbaros do terrorismo na região norte, é difícil encontrar respostas que tragam sossego às populações e às entidades nacionais e internacionais.