A crescente preocupação com a estabilidade das fronteiras de Angola foi recentemente destacada pelo Centro de Estudos para o Desenvolvimento Económico e Social de África (CEDESA). Em um relatório que será publicado oficialmente na sexta-feira, o CEDESA alerta que Angola precisa reforçar sua unidade interna e segurança nacional frente a uma nova realidade geopolítica, marcada pelo afastamento dos Estados Unidos da África, especialmente após a chegada de Donald Trump à presidência.
O cenário atual, segundo o CEDESA, apresenta um “absentismo americano em África”, contrastando com a abordagem de maior envolvimento adotada pelo governo anterior de Joe Biden. A análise sugere que a atual reconfiguração do sistema internacional exigirá de Angola não apenas um fortalecimento interno, mas também uma revisão da sua doutrina de segurança nacional para enfrentar novas ameaças que podem pôr em risco a estabilidade do Estado e suas fronteiras.
O relatório destaca como a ascensão de Trump à presidência dos EUA contribuiu para uma mudança de postura no continente africano. Isso é exemplificado pela intensificação do conflito no Leste da República Democrática do Congo (RDCongo), especialmente no caso do avanço das forças do movimento rebelde M23, apoiado pelo Ruanda, em direção a Goma e Kivu. Esse movimento tem gerado um ambiente de incerteza sobre as fronteiras africanas, com implicações diretas para Angola.
Além disso, o CEDESA aponta que a saída dos presidentes Félix Tshisekedi (RDCongo) e Paul Kagame (Ruanda) da mediação angolana no conflito envolvendo o M23 foi um reflexo dessa mudança na dinâmica internacional, com os dois líderes buscando apoio externo no Qatar, longe da mediação tradicional de Angola.
Com a retirada do apoio dos EUA, que anteriormente conferia força à negociação angolana, o CEDESA teme que a guerra no Leste da RDCongo possa se agravar. O impacto dessa situação não se limita à região central de África, pois há preocupações com a possível expansão do Estado Islâmico na África Oriental, que já afeta Moçambique e, possivelmente, estaria se expandindo para Angola, criando novas pressões nas fronteiras do país.
No entanto, o CEDESA também destaca um fenômeno mais amplo: uma “corrida para África”. As potências globais, como Rússia e China, estão cada vez mais interessadas nos vastos recursos naturais, na posição estratégica do continente no Sul Global e em sua demografia. Esse interesse renovado por África, aliado à fragilidade das suas instituições, coloca o continente em uma posição vulnerável, e Angola não está imune a essas dinâmicas externas.
Apesar desse cenário de pressão externa, o CEDESA enfatiza que as questões políticas internas de Angola, incluindo as suas escolhas democráticas e os processos eleitorais, são prerrogativas do país. O relatório ressalta que não se deve esperar por intervenções externas nas eleições gerais de 2027.
No entanto, o principal desafio para Angola no contexto atual está relacionado à sua soberania, fronteiras e segurança. Após as independências africanas, a Organização de Unidade Africana (OUA) adotou o princípio da inviolabilidade das fronteiras coloniais para evitar conflitos territoriais. No entanto, esse princípio está sendo cada vez mais questionado, com a incursão do M23 no Leste da RDCongo e o apoio do Ruanda, o que pode estabelecer novas realidades fronteiriças sem depender do direito internacional, mas sim da força.
Nesse contexto, as fronteiras de Angola estão sob ameaça, com o surgimento de movimentos separatistas em áreas como Cabinda e as Lundas, além da pressão das migrações causadas pela instabilidade nos países vizinhos. O CEDESA sugere que Angola deve considerar a criação de zonas de estabilização ao longo de suas fronteiras, especialmente nas áreas mais sensíveis, como Cabinda e as Lundas, para preservar sua segurança e a integridade do território.
A análise do CEDESA revela que, diante das novas dinâmicas internacionais e das crescentes ameaças à sua segurança, Angola precisará repensar sua estratégia de defesa e segurança para enfrentar os desafios que surgem no horizonte.