Luanda – Embora João Lourenço, atual Presidente de Angola, nunca tenha declarado publicamente sua fortuna ou negócios privados, há indícios de sua participação em grandes projetos empresariais durante o governo de José Eduardo dos Santos. Em 2009, um desses projetos envolveu a criação da “Companhia de Cervejas de Angola, S.A.”, avaliada em mais de 100 milhões de dólares, com a participação de Lourenço por meio de uma empresa familiar.
A empresa “JALC — Consultores e Prestação de Serviços Limited”, da qual Lourenço era sócio, entrou nesse projeto de investimento voltado para a construção de uma fábrica de cerveja na província do Bengo. A JALC é uma empresa familiar, cujo nome deriva das iniciais das filhas do casal presidencial, e era gerida inicialmente por Custódia da Encarnação Dias dos Santos, passando mais tarde para Cristina Lourenço.
O projeto foi aprovado por meio da Resolução n.º 84/09, assinada pelo então Primeiro-Ministro António Paulo Kassoma, e visava o desenvolvimento econômico local por meio da criação de empregos e produção de cerveja. Além de Lourenço, outros investidores, incluindo José Estêvão Daniel, atual administrador da Refriango, também fizeram parte do empreendimento.
Ainda em 2009, foi aprovada a “Sociedade Vidreira de Angola, S.A.”, outro projeto de 60,6 milhões de dólares, destinado à produção de vidro-embalagens também na província do Bengo. Assim como no primeiro projeto, João Lourenço participou por meio da JALC. Esses empreendimentos surgiram em um momento em que Lourenço ocupava o cargo de Vice-Presidente da Assembleia Nacional, levantando questionamentos sobre sua conduta ética.
A participação de Lourenço nesses projetos gerou críticas devido a possíveis conflitos de interesse. Segundo a “Lei Orgânica do Estatuto dos Deputados”, parlamentares são proibidos de participar de contratos com o Estado, algo que teria sido ignorado no caso de Lourenço e de outros políticos, como Dino Matross, então Secretário-Geral do MPLA. Relatórios da organização “Maka Angola”, liderada pelo ativista Rafael Marques, destacaram essa possível violação da lei.
A controvérsia gira em torno do envolvimento de altos funcionários em negócios privados enquanto ocupavam cargos públicos, o que fere os princípios de transparência e integridade.
A Presidência de João Lourenço e o combate à corrupção
Desde que assumiu a presidência em 2017, João Lourenço implementou várias reformas destinadas ao combate à corrupção, uma bandeira importante em seu governo. Essa postura é vista como uma tentativa de romper com o regime anterior, que frequentemente era acusado de práticas corruptas. A mudança de Lourenço pode ser atribuída a pressões internacionais para que Angola melhorasse sua governança, a fim de atrair mais investimentos estrangeiros.
Entretanto, apesar das reformas, a corrupção continua sendo um problema profundo em muitos setores do país. Críticos argumentam que a falta de transparência nas investigações e processos judiciais é uma das principais barreiras para avanços significativos no combate à corrupção. A situação é agravada pelo fato de que o próprio poder judicial enfrenta desafios, incluindo investigações contra o presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, acusado de envolvimento em práticas corruptas.
O envolvimento empresarial de João Lourenço em grandes projetos de investimento, antes de sua ascensão à presidência, ilustra a complexa relação entre negócios e política em Angola. Embora tenha adotado uma postura firme contra a corrupção durante seu governo, as controvérsias envolvendo sua atuação no passado continuam a levantar debates sobre a transparência e a ética no setor público angolano.