Macron ataca coligação entre direita moderada e extrema-direita, assim como a união entre socialistas e França Insubmissa. Eleições são importantes para haver “clarificação”, defende o Presidente.
“A direita republicana acaba de fazer pela primeira vez uma aliança com a extrema-direita. Virou as costas em poucas horas ao legado do general de Gaulle, Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy”, atirou Emmanuel Macron, que atacou igualmente a União Nacional, que considerou de “extrema-direita” por “dizer que há franceses verdadeiros e falsos” e “rejeitar o Estado de Direito”.
Neste sentido, o Chefe de Estado francês assegurou que não se vai demitir com um mau resultado nestas legislativas, assumindo igualmente que, em 2027, data em que termina o seu mandato, não quer dar “as chaves do poder” a Marine Le Pen, a antiga (e provável) candidata presidencial da União Nacional.
Numa conferência de imprensa quatro dias depois de convocar eleições legislativas antecipadas, decisão decorrente do mau resultado nas europeias, o Chefe de Estado também lançou críticas à “esquerda republicana”, nomeadamente ao PS francês, que se aliou com a “extrema-esquerda”. “Os socialistas unem-se a partidos que, em vez de apoiar a Ucrânia, apoiam a Rússia”, expôs Emmanuel Macron.
“No que diz respeito à social-democracia, à economia social de mercado, a esquerda alia-se à extrema-esquerda que foi acusada de antissemitismo, de comunitarismo e de antiparlamentarismo”, denunciou Emmanuel Macron, que sinalizou que todos estes princípios esbarram contra “os valores da República”.
Por tudo isto, EmmanuelMacron sublinhou que nenhuma das alianças “têm maioria para governar” e assume-se como o único que é capaz de governar de forma “consistente”, defendendo os “valores republicanos” com um bloco centrista liderado pelo seu partido, o Renascença, e que é composto por outras duas forças partidárias (Horizontes e Movimento Democrático).
“Não somos perfeitos. Tenho uma responsabilidade no sentido de não ter dado respostas rápidas e radicais”, reconheceu o Presidente francês, que insistiu, ainda assim, que são os únicos capazes de manter a “unidade”.
O bloco centrista, salientou o Presidente francês, une “famílias políticas com identidade própria” e “aprendeu a trabalhar em conjunto durante sete anos”: “É unido e claro em relação à República, à Europa e às suas prioridades”. “É a base de um projeto governamental coerente”, vincou Emmanuel Macron, que piscou o olho a “personalidades” da sociedade civil e desiludidos com outros partidos.
Adicionalmente, o chefe de Estado voltou a defender a convocação de eleições legislativas, acreditando que é necessário que os franceses façam uma “clarificação” sobre o seu futuro político. “O regresso ao povo soberano é a única decisão republicana”, frisou, realçando que se trata de “um momento histórico”.
Emmanuel Macron lembrou ainda que a oposição apresentaria uma “moção de censura” no outono, não existindo “coesão parlamentar”. “O bloqueio estava a tornar-se perigoso”, assinalou.
Sobre as eleições europeias, o Presidente francês considerou que os franceses “expressaram as suas preocupações sobre migrações, segurança o custo de vida”, admitindo mesmo que os franceses manifestaram o seu “ressentimento” face à atual solução governamental. Por tudo isto, Emmanuel Macron não se podia manter “indiferente”, convocando eleições antecipadas.
“Não podemos ser bloqueados por extremos. Há que dar um ato de confiança ao espírito republicano”, destacou o Presidente de França, recordando os resultados das europeias. “As forças de extrema-direita tiveram quase 40% e os extremos quase 50%. É um facto político que não podemos ignorar.”
Reatores nucleares, secularismo e proibição de redes sociais antes dos 15: Macron apresenta pacote de medidas para combate aos extremos
Ainda na conferência de imprensa, Emmanuel Macron anunciou um pacote de medidas que serão bandeiras da campanha. Inicialmente, o Presidente francês quer proteger os “valores republicanos” com mais “autoridade”. “Devemos, portanto, continuar a agir com mais segurança, mais firmeza, para implementar leis que foram aprovadas”, declarou o Presidente francês, indicando que tem como objetivo de “reduzir a imigração ilegal”.
Sobre o secularismo, o Chefe de Estado quer abrir um “grande debate”: “Devemos, como o fez o Presidente [Jacques] Chirac há 20 anos, reabrir um trabalho pacífico, exigente e republicano na nação e falar com todos os governantes eleitos, voluntários, associações e empresas”. Ambiciona ainda generalizar o serviço nacional universal até 2026 — que atualmente consiste em duas semanas de treino militar e duas semanas a prestar serviço comunitário.
No âmbito ambiental, o Presidente francês criticou quer a direita — que renuncia ao “projeto ecológico” — quer a esquerda pelas “políticas descabidas” sobre o fim do nuclear. Neste sentido, Emmanuel Macron prometeu instalar “oito novos reatores nucleares” em França. Para os mais novos, o Chefe de Estado francês quer ainda “proibir o uso de telefone antes dos onze anos” e das redes sociais “antes dos quinze”. “É preciso que haja uma lei para o digital”, reforçou.
A questão das pensões — bastante controversa em França —, foi um tema abordado por Emmanuel Macron. “As pensões estarão indexadas à inflação”, prometeu, criticando as propostas dos outros partidos.
Sobre a política externa, o Presidente francês quer uma França como “potência de paz e equilíbrio” quer no que concerne à Ucrânia, quer no que diz respeito ao Médio Oriente. “Os dois blocos de extremos não permitem esse plano”, argumentou.
À esquerda, continuou, existe uma “visão balcanizada da política e da diplomacia”: “Há oposição de certas forças à dissuasão nuclear e à NATO”. À direita, Emmanuel Macron disse que há forças políticas que querem “a saída da NATO”. Frisou ainda que alguns partidos querem colocar em causa a “independência” de França em relação à Rússia.
Demissão após mau resultados nas legislativas seria “absurdo”, diz Macron
Após uma longa intervenção, Emmanuel Macron respondeu às perguntas dos jornalistas. Questionado sobre se fará campanha nestas legislativas, o Presidente francês rejeitou essa ideia. “Assim como não fiz em 2017 e em 2022. O Presidente não precisa de fazer campanha”, enfatizou. Numa entrevista esta terça-feira, o primeiro-ministro, Gabriel Attal, indicou que será o rosto mais visível da campanha.
“O Presidente da República deve traçar um rumo e uma visão. Não deve fazer campanhas nas legislativas”, assumiu Emmanuel Macron, que se negou a debater contra Marine Le Pen, líder parlamentar da União Nacional. “Fiz-lhe essa oferta nas europeias. Mas ela não compareceu à reunião”, disse o Chefe de Estado, que negou que estas eleições pudessem consistir numa desforra da RN. “Compreendo que a senhora Le Pen queira repetir as eleições presidenciais, dizendo que eu tenho de me demitir. Convido-a a ler a Constituição”, atirou.
Questionado sobre se se demitiria após um mau resultado da coligação centrista nestas legislativas, o Presidente francês afastou essa hipótese. “Seria absurdo”, clarificou, acrescentando que a sua “eleição ficou decidida em 2022” — e é “para cinco anos”. “Isso está claro.”
Ainda assim, Emmanuel Macron reconheceu que não quer entregar as “chaves do poder” à “extrema-direita” em 2027, numa tendência de crescimento destes movimentos políticos, que, segundo o Chefe de Estado, é transversal a toda a Europa.
Interrogado sobre como será uma possível coabitação com o candidato da União Nacional a primeiro-ministro — Jordan Bardella —, o Presidente francês optou por não dar uma resposta concreta. “Nunca fiz ficção política, mas, sobretudo, não tenho espírito de derrota”, assinalou, dizendo que a vitória da RN está longe de ser certa. “O que me impressiona é o espírito de derrota.”
À esquerda, com a possibilidade de Jean-Luc Mélenchon ser eleito primeiro-ministro, Emmanuel Macron questiona diretamente o PS francês se estaria confortável com essa ideia e sugere que ainda não houve uma resposta concreta por parte da Frente Popular. “É necessário um esclarecimento até ao fim de semana. Que todos os sociais-democratas e ecologistas se perguntem se querem uma aliança com partidos com os quais discordam.”