Não tenho dúvidas que uma aposta no café, o denominado “ouro negro”, e no abacate, o chamado “petróleo verde”, serão dois investimentos bem conseguidos, porque Angola tem ‘know-how’ instalado no país.
Na semana passada tive a oportunidade de acompanhar, em Luanda, a conferência “Agricultura 3.0 – A semente dos negócios sustentáveis inclusivos”, organizada pela revista “FORBES – África Lusófona” e que mobilizou os diferentes agentes do setor.
Retive desta iniciativa – muito bem organizada e com intervenções muito pertinentes – uma mensagem mobilizadora do Estado e das empresas sobre o futuro agrícola de Angola, que já tem 27 grandes empresas no sector, mas com potencial para desenvolver muitas mais.
Nas últimas décadas, o êxodo dos campos para a cidade em busca de novas oportunidades de vida foi uma realidade em África. Este movimento explica que Luanda concentre quase metade da população do país. Porém, hoje os campos voltaram a trazer oportunidades de vida e de trabalho – estão a surgir novas centralidades no interior – o que provoca um estancamento do fluxo de pessoas do interior para as cidades. O sector agrícola é de tal maneira relevante que é o maior empregador nacional.
No entanto, não devem ser confundidas duas realidades muito distintas, e ambas importantes para Angola, mas que devem ter políticas e incentivos díspares: a promoção da micro agricultura familiar e as empresas agrícolas (de pequena, média e grande dimensão). Assim como a diferença entre os produtos agrícolas para consumo interno e aqueles que têm potencial para exportação.
Quando o Estado determina que vai desenvolver uma estratégia de autossuficiência alimentar, isso significa que tem de identificar muito bem que produtos alimentares deve escolher para plantar e produzir em larga escala. Ou seja, é inviável apostar em todos os produtos agrícolas de forma igual. A prioridade deve ser dada, como é evidente, a produtos que trazem maior criação de valor ao país.
Não tenho dúvidas que uma aposta no café, o denominado “ouro negro”, e no abacate, o chamado “petróleo verde”, serão dois investimentos bem conseguidos, porque Angola tem know-how instalado no país, o que permite ter um retorno rápido em apenas dois ou três anos.
Em 1973, Angola era o segundo maior produtor do mundo de café com 220.000 toneladas por ano. Hoje, Angola produz apenas cerca de 10.000 toneladas de café. Em apenas dois anos, utilizando a tecnologia adequada e o know-how local que já existe, será possível semear e colher muito café. Ou seja, em dois anos é possível multiplicar várias vezes a produção atual. Ainda por cima, o café angolano prima por ser de excelente qualidade.
Mais, o café é particularmente importante, porque o consumo local de café é residual (inferior a 1%), o que significa que o café para Angola pode ser sinónimo de divisas.
A Angonabeiro, do Grupo Delta, tem feito uma aposta no investimento da produção local de café apoiando mais de 20.000 famílias e comprando anualmente mais de 1.200 toneladas de café, em Angola, que é maioritariamente destinado à exportação. Contudo, existe um espaço tremendo de crescimento da produção de café em Angola.
Em relação ao abacate, o “petróleo verde”, é uma das frutas com maior crescimento de consumo no mercado internacional, o que a torna especialmente apetecível também para o mercado da exportação e para a geração de mais divisas que o Estado tanto precisa.
Angola tem, em relação ao abacate, uma enorme e objetiva janela de oportunidade, porque os períodos de produção do abacate em Angola são desfasados dos períodos de produção no resto do mundo.
Porém, a espécie de abacate que a Europa consome é a “Hass” e a espécie que existe em Angola é maioritariamente a “Margarita” e a “Fuerte”. O desafio de Angola é trabalhar na conversão da espécie e abraçar esta oportunidade que tem nas mãos, assim como apostar na produção azeite, manteiga ou maionese tendo como base o abacate.
É verdade que estamos perante um fruto que para ser plantado e colhido implica um maior conhecimento e experiência do que em relação ao café, mas também é verdade que estamos perante um fruto que não precisa de frio e depende menos de pesticidas e fertilizantes do que outros frutos.
Para atingir estes objetivos tão importantes para o futuro de Angola, o Governo deve implementar uma política de fomento que crie efetivas condições e incentivos para que as empresas angolanas e outras de capital estrangeiro possam abraçar este desígnio no café, no abacate e em outros produtos que sejam definidos como estratégicos.
Para além do papel do Estado, o sector financeiro também tem o seu contributo neste desígnio nacional. Por exemplo, no ano de 2023, os créditos à agricultura no Banco de Comércio e Indústria (BCI) representaram 16% do total de créditos concedidos.
É justo reconhecer que o sector agrícola teve uma transformação grande nos últimos anos. Um bom exemplo disso é o Grupo Carrinho que, este ano, já irá colher 300 mil toneladas de milho nos campos angolanos. Já é uma dimensão de produção agrícola muito assinalável.
A empresa Carrinho Agri, através do “Programa de Fomento da Agricultura Familiar”, está a dar condições de produção agrícola a cento e cinquenta e cinco mil produtores angolanos. Confesso que fiquei surpreendido com a dimensão e alcance deste Programa.
No entanto, e como várias vezes foi referido na conferência por diferentes oradores, os desafios são muitos para que toda esta aposta nacional na agricultura possa cumprir o seu desígnio.
A prioridade na formação dos agricultores, os incentivos do Estado para aquisição de tecnologia para as empresas, a recuperação e a manutenção de estradas que garantam a operação logística de transporte dos produtos agrícolas, e tantas outras necessidades, devem fazer parte do “caderno de encargos” nacional do sector.
Termino, sublinhando a nota importante com que iniciei este artigo de opinião: “ouvi mensagens muito mobilizadoras do Estado e das empresas sobre o futuro agrícola de Angola”. Haja esperança!