O Parlamento vai apreciar nos próximos dias o relatório de execução trimestral do Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2023. Mas os dados que constam no documento não agradam a muitos deputados, nem da oposição, nem do partido no poder, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
No terceiro trimestre de 2023, do total de 164 administrações municipais, apenas 46 remeteram as devidas prestações de contas. Das 18 províncias que constituem Angola, somente quatro justificaram os gastos “por completo”, segundo o documento em posse da Assembleia Nacional.
Trata-se das províncias do Cuanza Norte, Malange, Huambo e Namibe. Outras das instituições que não prestaram contas foram as missões diplomáticas de Angola, comentou a deputada Nádia Monteiro, do MPLA. “Das 88 missões diplomáticas e consulares, apenas 23 prestaram contas de forma regular, 36 prestaram contas de forma irregular e 29 não prestaram contas.
O que mostra também um baixo nível de transparência dos fundos públicos disponibilizados.” Manuel da Fonseca, deputado pelo grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), diz que o relatório de execução do OGE é um indicador de como os recursos financeiros estão a ser mal geridos. “Num exercício sério, isso devia se mandar para casa, porque de nada serve.
Com todo o respeito, estamos aqui a fazer o nosso trabalho, mas não tem nenhum impacto”, lamentou o parlamentar da oposição. A situação é preocupante, diz Bartolomeu Milton, presidente da Pro Bono Angola, uma organização não-governamental que defende a transparência pública no país. Até porque, segundo Bartolomeu Milton, além de apresentar as contas, é também preciso verificá-las.
“O que se está a dizer apenas em relação às quatro províncias é que elas apresentaram as contas, mas ninguém auditou estas contas. Só faz sentido falar de prestação de contas, de facto, após estas serem auditadas, após passarem pelo crivo de uma auditoria profunda e se verificar a sua integridade. Porque mesmo quando há prestação de contas, pode se constatar que há má-gestão também.” Para Bartolomeu Milton, um grande problema na administração pública angolana é a falta de mecanismos de controlo e responsabilização concreta.
O jurista alerta ainda que as constantes nomeações e exonerações efetuadas pelo Presidente João Lourenço também têm contribuído para a não prestação de contas. “É preciso que se faça uma anterior avaliação do perfil do gestor para ver se, de facto, reúne requisitos para estar na função o mínimo tempo possível, ” considera.
“O que temos estado a constatar é que as pessoas são nomeadas e seis meses depois são exoneradas. Isto atrapalha substancialmente a gestão – faz com que não haja consequência na gestão – e por conseguinte não se apresente relatórios de prestação de contas,” pondera o analista.
Bartolomeu Milton avisa que, sem meios para monitorar a gestão dos fundos públicos, Angola poderá registar maiores desvios. “O que dizer então agora que queremos estender o país para 325 municípios?” questiona. “Se com 164 municípios já temos dificuldades de prestação de contas, sem melhorarmos o mecanismo de gestão de prestação de contas, no horizonte, teremos [um problema ainda] maior nos cofres públicos, porque não estão efetivamente criados os mecanismos de controlo de gestão parcimoniosa dos recursos,” conclui o presidente da ONG Pro Bono Angola.
C/DW