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Como espiões russos obteram nacionalidade Portuguesa: Uma história de infiltração e identidades falsas

by REDAÇÃO

A recente revelação sobre dois agentes russos que obtiveram a nacionalidade portuguesa através de uma teia de identidades forjadas trouxe à tona as fragilidades do sistema de registo civil. O caso, investigado por veículos internacionais como a Euronews, o Nascer do SOL e o The New York Times, mostra como espiões russos conseguiram infiltrar-se em países ocidentais construindo cuidadosamente uma “lenda”, como é chamada a falsa biografia usada por agentes ilegais.

Tudo começou no Brasil, em 2016. Com identidades falsas, Vladimir Aleksandrovich Danilov e Yekaterina Leonidovna Danilova tornaram-se oficialmente o casal Manuel Francisco Steinbruck Pereira e Adriana Carolina Costa Silva Pereira. Em fevereiro daquele ano, Manuel Pereira abriu uma empresa de antiguidades no Rio de Janeiro. Logo depois, o casal formalizou o casamento num cartório da cidade, fortalecendo ainda mais a nova identidade.

Manuel afirmava ser filho de um português de Vila Real, Camilo Pereira. Adriana, por sua vez, adaptou o nome após o casamento para coincidir com a nova biografia construída. O objetivo era claro: criar uma vida autêntica, com raízes familiares e histórico legalmente reconhecido, para futuramente legitimar o pedido de cidadania portuguesa.

Mais de um ano após o casamento, Manuel dirigiu-se ao consulado português no Rio de Janeiro para solicitar a nacionalidade portuguesa, alegando filiação com um cidadão português. Apresentou documentos e uma declaração de paternidade assinada por Camilo Pereira — cuja veracidade está agora sob suspeita. Em janeiro de 2018, o assento de nascimento de Manuel foi oficialmente inserido no sistema português.

Com a nacionalidade de Manuel assegurada, o casal concentrou esforços na cidadania de Adriana. Aproveitando a lei portuguesa que permite a nacionalidade a cônjuges de cidadãos portugueses após três anos de casamento, Adriana também conseguiu o estatuto de cidadã nacional. Entre 2018 e 2019, o casal fez viagens a Portugal, incluindo estadias no Porto, onde alugaram um apartamento.

A operação começou a ruir com a prisão de Sergey Cherkasov, outro espião russo com uma identidade forjada semelhante. Quando tentou assumir um estágio no Tribunal Penal Internacional, foi descoberto pelas autoridades holandesas e deportado para o Brasil, onde foi condenado por uso de documentos falsos. A detenção de Cherkasov alertou os serviços de inteligência, que passaram a investigar outras possíveis infiltrações — incluindo o casal que operava com cidadania portuguesa.

Curiosamente, não foi o Brasil que informou Portugal sobre a presença dos espiões. O alerta chegou ao Serviço de Informações de Segurança (SIS), que, ao confirmar a identidade falsa do casal, informou o Instituto dos Registos e Notariado (IRN). Os documentos de identificação foram cancelados e foi aberto um processo para investigar a legalidade das naturalizações.

O caso abriu um debate interno sobre as vulnerabilidades nos processos de registo civil português. Fontes do setor relataram que a falta de mecanismos de verificação robustos pode facilitar a entrada de identidades falsas no sistema. Segundo relatos, esta não foi a primeira tentativa russa de aceder a informações civis portuguesas. Em 2013, foi identificado um comportamento suspeito por parte de um funcionário da embaixada russa, que fazia visitas regulares à Conservatória dos Registos Centrais em Lisboa.

A gravidade da situação levou o SIS a promover formações para conservadores de registos, destacando o valor estratégico das bases de dados nacionais e a importância da vigilância contra interesses estrangeiros.

A história dos “ilegais” russos em Portugal é mais do que um caso isolado — é um alerta. Mostra como estratégias sofisticadas de espionagem podem infiltrar sistemas civis e destacar a necessidade de reforçar os controlos documentais e as cooperações internacionais. Para Portugal e outros países, é hora de rever protocolos e proteger a integridade dos seus registos contra ameaças invisíveis, mas reais.

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