No dia 25 de Abril deste ano, de 2024, completa-se 50 anos desde que ocorreu a Revolução dos Cravos em Portugal, no dia 25 de abril de 1974, que derrubou o sistema fascista e ditatorial que vigou em Portugal e nas Províncias Ultramarinas durante o Estado Novo, que foi dominado (1933-1968) por António de Oliveira Salazar, que nasceu em Vimieiro no dia 28 de abril de 1889 e faleceu em Lisboa no dia 27 de julho de 1970.
Fonte: Club-k.net
Devida a saúde precária do António de Oliveira Salazar, impossibilitado de governar, Marcelo José das Neves Alves Caetano foi nomeado no dia 27 de setembro de 1968, pelo Américo Tomás, para substituir Salazar no cargo de Presidente do Conselho dos Ministros do Estado Novo. Efetivamente, o Marcelo Caetano foi o último Presidente do sistema fascista do Estado Novo que desmoronou-se no dia 25 de Abril de 1974, com a tomada do poder pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) de Portugal.
Historicamente, a colonização de Angola (de hoje) durou 400 anos, de 1575 até 1975. Iniciou com a chegada de Paulo Dias de Novais em Luanda que trazia consigo 100 famílias de colonos e 400 soldados portugueses. Devemos ter em conta que, o navegador português, Diogo Cão, desembarcou na foz do rio Zaire em 1484. Dali para diante iniciara a evangelização, penetração ao interior, guerras de kuata-kuata (rusgas), o tráfico negreiro e guerras de conquistas e de ocupação. Finalmente, os territórios conquistados e ocupados foram colonizados. Em 1834 todos os territórios colonizados da África foram anexados à Portugal e receberam o “estatuto” de províncias ultramarinas. Isso aconteceu na antecipação da Conferência de Berlim (15/11/1884 – 26/02-1885) que marcou decisivamente a partilha arbitrária do Continente Africano, em colónias europeias.
Voltando ao assunto, isso significa que a presença de Portugal em Angola foi de 491 anos. Apesar deste período conturbado, de cerca de 500 anos da dominação portuguesa, António de Oliveira Salazar, de entre outros, destacou-se e deixou marcas indeléveis sobre a história do colonialismo português em África. Paradoxalmente, Doutor António de Oliveira Salazar, na história contemporânea de Portugal, é tido como o “Melhor” Gestor Público de Portugal.
Pois, foi ele que organizou e reestruturou as Finanças e a Administração Pública de Portugal. Aliás, ele foi o responsável pela consolidação do Estado Novo e pela implantação e afirmação ideológica do regime fascista de Portugal, conhecido por Salazarismo. Veja que, o António de Oliveira Salazar foi um homem erudito, do mais alto grau académico, professor catedrático de Economia Política, Ciência das Finanças e Economia Social da Universidade de Coimbra.
Politicamente, o António de Oliveira Salazar defendia a tese de que, “o seu objetivo principal era de estabelecer a ordem e a estabilidade nacional. Mas, mesmo depois de isso ser alcançado, ele iria continuar com a Revolução enquanto em Portugal existir «uma só pessoa» sem condições de vida aceitáveis.” De facto, na Era do Salazar a economia portuguesa cresceu, em detrimento das colónias (províncias ultramarinas) africanas, cujas riquezas (recursos naturais) abundantes foram saqueadas e levadas à metrópole. Neste processo, os povos colonizados foram submetidos ao sistema severo de exploração da mão-de-obra barata e da discriminação racial por via da «Assimilação» e do «Estatuto do Indígena». Curiosamente, este Estatuto foi elaborado minuciosamente e legislado em vários diplomas legais.
Na verdade, o Estatuto do Indígena, em termos económico, social, cultural, linguístico, jurídico e legal, foi uma consagração evidente do sistema racial. Que destacava a supremacia racial e a estratificação social das sociedades colonizadas entre os brancos, mestiços e pretos, respetivamente. Entre os pretos, existia uma distinção e uma discriminação rígida entre os assimilados e os nativos indígenas. Os mestiços, como estrato social, tinha um estatuto privilegiado, intermédio, mas mais próximo da comunidade branca. Na verdade, o racismo colonial português estava bem elaborado, definido, estruturado, hierarquizado e legislado. Em certos aspectos o racismo português aproximava o Apartheid da África do Sul.
Importa sublinhar que, o racismo do sistema colonial português tinha um cunho cultural muito forte. Tendo sido utilizado como instrumento principal da alienação mental e da dominação cultural dos povos colonizados e oprimidos. Como resultado, o seu impacto é extraordinário sobre a consciência das pessoas, sobretudo das novas gerações que estão totalmente alienadas, assimiladas e aculturadas, sem ter uma base sólida das matrizes culturais africanas.
Angola, por exemplo, é um país culturalmente colonizado sem dignidade africana e sem o sentido patriótico da angolanidade e da cidadania. O processo da assimilação portuguesa e da destruição da cultura nativa angolana ganhou ímpeto e dimensões mais demolidoras na pós-independência em 1975. Dali para diante o Partido MPLA baniu o uso e o ensino das línguas nativas angolanas e encetou uma campanha sistemática contra os valores culturais africanos.
Por isso, analisando bem o contexto actual notarás que a independência de Angola, em termos económico e cultural, tem sido mais vantajosa à Portugal do que ao povo Angolano que continua na mesma condição de inferioridade, da exclusão sociocultural e da pobreza extrema. Angola continua a exercer o mesmo papel do tempo colonial de ser a fonte principal de receitas das Finanças Públicas do Estado Português. A economia portuguesa depende, de grosso modo, do mercado angolano, em termos de capital financeiro, de recursos naturais, de investimentos, de mercado de trabalho, de prestação de serviços e de outsourcing.
Na realidade, tudo passa pelo Portugal, tais como, fugas de capitais e desvios de avultadas de somas de dinheiros que entram em Portugal ou passam pelo Portugal, vindos de Angola. De certo modo, Portugal pode ser considerado como um «paraíso fiscal» dos governantes angolanos. Em termos concretos, isso enriquece o povo português e impulsiona a economia portuguesa, criando postos de trabalho e investimentos significativos em diversos sectores da economia portuguesa. Lamentavelmente, existe os desequilíbrios abismais em diversos domínios da cooperação bilateral entre Portugal e Angola.
Politicamente, Portugal deu um passo gigantesco na construção de instituições democráticas fortes, estáveis e funcionais. Hoje, Portugal é um Estado Democrático de Direito, com poderes separados e interdependentes, assente na economia de mercado. É incrível constatar que, até Abril de 1974, Portugal que foi uma Ditadura, um Império Colonial, mas após 50 anos, ele tornou-se um Estado Democrático de Direito, com uma economia em crescimento, cujo povo está livre e tem condições de vida razoáveis.
Contrariamente, Angola, com imensos recursos naturais (minerais estratégicos), que foi colonizada, oprimida e explorada, hoje ela se mergulhou na ditadura, na corrupção e na pobreza extrema. A luta que foi travado pelos angolanos (em busca da liberdade, da autodeterminação, da justiça social, da igualdade, do bem-estar e do progresso) tornou-se um fisco. Pois que, se instalou no País o sistema neocolonial, assente no capitalismo selvagem, em que, um punhado de indivíduos no poder apoderou-se do Aparelho do Estado, das Instituições Públicas, do Capital Financeiro e dos Meios de Produção.
Convinha salientar que, em Angola, em vez de promover o pluralismo, cidadania, angolanidade, patriotismo e a unidade nacional, o Partido no Poder (desde 1975) incute nas mentes das pessoas o ódio, revanchismo, partidarismo, totalitarismo, intolerância política, exclusão social e a hegemonia político-partidária. O incidente recente do Longa, no Cuando Cubango, onde os Deputados do Grupo Parlamentar da UNITA, em deputação, foram alvos do ataque violento pelos militantes do MPLA, com a cobertura da Policia Nacional, é um exemplo concreto da cultura de violência, de exclusão e da hegemonia política.
Deste modo, cresce em Angola Etnia-Partido, que se manifesta em forma de «Nação». Por isso, quando invoca «Angola», não significa Angola como Território ou como Estado-Nações. Mas sim, como “Estado-Partido,” que assenta na Etnia-Partido. Este Estado-Partido exclui todos os Angolanos que não se reveem no Partido no Poder, que encarnou em si a Nação e o Povo, dentro do guarda-chuva do Estado-Partido. Assim, a «soberania popular» ficou despida de todos os poderes constitucionais. A democracia plural e institucional ficou apenas no papel.
Repare que, os Palestinianos e os Hebreus faziam parte da mesma Etnia Semitas (oriunda da Mesopotâmia) que, na Antiguidade, era composta por vários subgrupos étnicos, tais como: assírios, babilônios, arameus, cananeus e fenícios. Contudo, com o surgimento de disputas políticas, religiosas e territoriais, em busca da supremacia e do domínio cultural, dividiram-se em franjas antagónicas entre os Povos Hebreus Judeus e os Povos Palestinianos Árabes. O Oriente Médio ficou assim mergulhado nas rivalidades interétnicas, que prevaleceram muito antes do nascimento do Jesus Cristo, e que continuam até hoje.
Em termos analógicos, Angola está a correr este risco da afirmação de «Etnias- Partidos», com origens de bases sociais étnicas distintas. Entre a Etnia-MPLA e a Etnia-UNITA. Já que, a FNLA está moribunda. A sua base social étnica está à deriva. Como sabemos, existem antecedentes históricos e sociológicos das matrizes e das bases sociais étnicas, que estiveram na origem do surgimento dos três Movimentos de Libertação Nacional.
Resumidamente, creio que, Portugal tem todos os motivos de celebrar com pompa e circunstância os 50 anos do 25 de Abril de 1974. Porque, de facto, Portugal sacudiu-se do fascismo, da ditadura, do colonialismo e do isolamento da família europeia. Hoje, Portugal é o dono de si próprio, está completamente integrado na União Europeia e na OTAN. Tem uma economia estável, sustentável e em pleno crescimento. Acima de tudo, Portugal ganhou prestígio na comunidade internacional.
Neste âmbito, Portugal tem o potencial intelectual enorme. Ele soube criar o sistema de educação e de saúde de alta qualidade, projetando os seus quadros na comunidade internacional. A título de exemplo, Doutor António Guterres ocupa o cargo de Secretário-geral das Nações Unidas, gozando de muito boa reputação, de confiança e de prestígio na comunidade internacional. É uma personalidade carismática, humanista e defensor acérrimo do Direito Internacional e do Multilateralismo.
Apesar da descolonização, de ter deixado as suas colónias africanas, Portugal mante raízes muito profundas no continente africano por via das relações de cooperação bilateral e multilateral com as suas antigas colónias, em todos os domínios. Sem dúvida nenhuma, Portugal tornou-se uma «placa-giratória» do Capital vindo das suas antigas colónias africanas, sobretudo de Angola.
Curiosamente, as elites governativas africanas, cujos povos foram colonizados durante Cinco Séculos, passando 50 anos de independência nominal, eles continuam a olhar discretamente a Portugal como a «casa mãe», na qual estão a depositar (esconder) os seus grandes tesouros. Com as suas famílias oligarcas, esta classe governante africana, passam o tempo nas metrópoles portuguesas, dando-se ao luxo de grandeza, aos gastos supérfluos e aos lazares faustosos. Também é pelo Portugal onde os jovens africanos desempregados encontram a porta de saída ao Ocidente para realizar os seus sonhos perdidos.
Parece-me que, Portugal é ainda um «Império Oculto» que tem os seus sustentáculos bem lançados e enraizados na economia e na cultura das suas antigas colónias. Certamente, com muita habilidade e astúcia, Portugal tem estado a desempenhar o papel de intermediário entre os investidores estrangeiros e as suas antigas colónias. Aliás, Portugal é o «Dono» das suas antigas colónias, influencia enormemente os processos políticos nas suas antigas colónias, sobretudo em Angola.
Enfim, nós os africanos, que estivemos no centro dos acontecimentos que conduziram à Revolução Militar em Portugal, estamos nessas condições lamentáveis, de sermos «Feudos» de Portugal, a antiga Potência Colonial. Tristemente, é nesta condição que estaremos presentes em Lisboa no dia 25 de Abril nas celebrações do Meio Século do derrube do Salazarismo, do Estado Novo.
Para terminar, Portugal não foi apenas capaz de derrubar o salazarismo, mas sim, conseguiu de neutralizar a corrente comunista no seio do MFA, apoiada pela União Soviética, que visava tomar conta do poder e inviabilizar a Revolução Democrática em Portugal. Pelo contrário, Angola conseguiu de se libertar do jugo colonial português, mas logo, mergulhou-se na ditadura comunista, que prevalece até hoje.
Neste contexto, uma coisa é certa, a descolonização de Angola foi um desastre. Lisboa não cumpriu com os Acordos de Alvor entre Portugal e os três Movimentos de Libertação Nacional – FNLA/MPLA/UNITA. Portugal foi cúmplice na «invasão» russo- cubana de Angola. A Doutrina da «Assimilação» e do «Indigenato» falou mais alto neste Processo.
RACISMO!
Luanda, 22 de Abril de 2024